Texto CB1A1-I
A
emergência de uma grande variedade de plataformas digitais, desde o final da década de 1990,
provocou uma mudança econômica radical e uma reorganização de mercados e arranjos de trabalho. A
economia de plataforma não está apenas mudando a forma como o trabalho é realizado e
remunerado. Os mercados de trabalho também estão se transformando drasticamente, levando a
uma situação em que o “emprego padrão” é cada vez mais suplementado ou substituído por trabalho
temporário “fora do padrão”, mediado por plataformas. Em um contexto de crescente instabilidade
macroeconômica, de desregulamentação das relações de trabalho — em função do impacto disruptivo
de tecnologias digitais na intermediação dessas relações —, verifica-se a emergência de novas formas
de emprego “fora do padrão”, que reforçam diversos tipos de “flexibilidade” — temporal, espacial,
gerencial e funcional, entre outras. Grande parte dessas novas formas de emprego está vinculada à
mediação de plataformas digitais, que conectam ofertantes e demandantes de trabalho.
As
plataformas digitais facilitam a articulação entre ofertantes e demandantes de trabalho que, de outra
forma, poderiam ter dificuldades para interagir entre si, tornando a realização de transações mais
eficiente do que seria possível em relacionamentos bilaterais entre as partes, fornecendo infraestrutura
e regras para sua realização. No âmbito dessas plataformas, a correspondência (matching) entre ofertantes e demandantes de trabalho pode
ser feita de forma eficaz, por exemplo, por meio de algoritmos que diminuem a quantidade de tempo
utilizado para encontrar trabalhadores adequados para tarefas específicas, além de oferecer a base
para o controle e gerenciamento dessas tarefas.
No entanto,
a força de trabalho torna-se mais vulnerável, pois as leis trabalhistas ainda se baseiam em um antigo
sistema “binário”, segundo o qual quem é empregado recebe direitos — por exemplo, aviso de
demissão ou férias pagas —, mas para quem é contratado o acesso a esses direitos tende a ser
restringido. Assim, se o modelo de plataformas de trabalho com a interveniência de uma gestão
algorítmica oferece vantagens no que se refere à flexibilidade sobre formas convencionais de
organização e gestão do trabalho, esse mesmo modelo suscita questões relevantes como a distribuição
desigual de oportunidades, benefícios e riscos entre os agentes envolvidos, bem como os possíveis
custos sociais advindos de uma eventual precarização das relações de trabalho.
Herbert P. S. de Oliveira e Jorge N. de P. Britto. Gerenciamento e disciplina algorítmica:
uma análise focalizada em plataformas de emprego de elevada
qualificação.
Economia e
Sociedade, Campinas, v. 32, n.º 3 (79), 2023 (com adaptações).